Assim seu Zé
principiou contando o ocorrido que acometeu seu vizinho de lote,
distante mais ou menos quatrocentos metros da sua casa. É que os
terrenos daqui são bem grandes, se bem que agora está tudo
repartido, tanto o lote do seu Zé como o do vizinho, sendo que o
vizinho já nem mora mais no lugar.
O vizinho vivia se
mordendo de raiva por que seus filhos estavam com uma mania de
falarem sozinhos pelos cantos da casa. Isso irritava o velho de tal
maneira que sua vontade era de socar os filhos para que calassem a
boca, mas quando mandava um ficar quieto outro lá estava em seu
canto falando e conversando animadamente. Ele corria repreender esse
quando o terceiro já se encontrava na maior alegria rindo,
matracando e até discutindo. Isso o irritava tanto que não se
agüentava e saia de casa esbravejando de raiva.
Sua mulher tentava
amenizar as coisas falando que criança é assim mesmo, brinca
imaginando coisas...
Um dia o homem viu que
os três meninos estavam numa discução calorosa debaixo de uma
macieira e a ponto de se grudarem um no pescoço do outro. Só que o
pai olhando de longe teve uma impressão, quando chegou mais perto
percebeu que as crianças brigavam com a árvore. Tentou forçar a
vista para ver se via alguém atrás do tronco ou em cima da macieira
mas não conseguiu visualizar ninguém. Será que tem alguém
escondido na árvore colocando besteira na cabeça dessas crianças?
Pensou.
Esperou até o final
do entardecer escondido atrás duma pedra quando as crianças
atenderam o chamado da mãe para entrarem pra dentro de casa.
Armou-se de um pedaço de pau e se aproximou cuidando de todos os
lados para ver se via alguém sair correndo, só que não viu nada
nem ninguém. Olhou para cima da copa da árvore e também não viu
nada, então, resolveu passar umas horas por ali.
Subiu na macieira e se
acomodou em um de seus galhos, puxou a gola do jaquetão e se pôs a
espreitar o terreno em volta para ver se não surpreendia alguém
escondido furtivamente por ali. Notou que seu galho se inclinava
devagarzinho cada vez mais para baixo e tratou de arrumar mais para
perto do tronco onde todo galho é mais grosso, qual foi sua
surpresa, o galho continuava inclinando cada vez mais. Uma ponta de
dúvida e medo gelado lhe correu a espinha!
Como o galho parou de
inclinar tratou de passar para o galho de cima que era um pouco mais
grosso que aquele. Acomodou-se. Não demorou dois minutos e seu galho
começa a inclinar para baixo novamente. Não teve dúvidas, berrou
donde estava:
- Quem está aí? Se
for coisa ruim vá embora e deixa meus meninos em paz!
Nem havia terminado de
falar quando o galho da frente estala acertando seu rosto em cheio,
desequilibra tentando se proteger e cai pro galho de baixo, este
sacode violentamente virando-o de barriga pra baixo. Como que se
aproveitando da situação, um punhado de varas lhe arremete a bunda
dando-lhe uma sova que jamais tomara em toda sua vida. Caiu da
macieira aos berros e entrou pra dentro de casa segurando as nadegas
em flor de vergões, pois a cada varada rasgava-lhe a calças.
Esbravejando toda sorte de palavrões e no mesmo fervor chamando tudo
quanto é santo disparou quarto adentro acompanhado pela mulher para
lhe cuidar as feridas.
Noutro dia sua mulher
ficou sabendo pela boca das vizinhas que uma bruxa muito famosa
andava faceira pela sede do Piên fazendo compras. A tal até macumba
contra lobisomem sabia fazer, quem sabe não resolvia esse problema
também? Seu nome era Grena Matados do Lageado dos Mortos.
Então o pai das
crianças pegou uma charrete e foi pro centro ver se encontrava a
mulher, qual foi sua surpresa, ela já estava a sua espera na esquina
dos Tabordas.
Chegando em casa, dona
Grena Matados foi logo interrogando as crianças, o que achou o maior
absurdo o pai delas, mas as crianças foram categóricas em responder
todas as questões e ainda informar que quando brigavam com os
amiguinhos invisíveis era por causa do pai, que sendo muito rude e
ruim com a família, eles queriam divertir-se um pouquinho com ele. O
homem petrificou de medo!
Dona Grena Matados foi
sozinha até a macieira e deu início a uma reza braba, depois chamou
anjos, arcanjos e outras entidades para ajudar a colher os espíritos
e encerrou tampando todos num potinho de vime com tampa de desenho
esquisito. Quando voltou falou com cara feia pro homem da casa que se
ele não mudasse de atitude com sua família, não haveria reza braba
que o livrasse da próxima vez.
O homem mudou de
atitudes grosseiras para a de um pai amoroso, o tempo passou, os
meninos cresceram e até hoje os amiguinhos invisíveis deles não
mais apareceram.
Eber